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sábado, 6 de novembro de 2010

FINALMENTE UMA VITÓRIA NO TJAM!


O Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, por unanimidade, concedeu mandado de segurança para autorizar a instauração da CPI dos Transportes (que havia sido arquivada de forma arbitrária pelo presidente Carijó). Parabenizo a Nobre Desembargadora Encarnação Sampaio pelo brilhante voto. Veja a íntegra do MS:




EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR DO EGERÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAZONAS.







HISSA NAGIB ABRAHÃO FILHO, brasileiro, amazonense, casado, economista, Vereador do Município de Manaus, portador da cédula de identidade sob o número 1474507-0, com endereço na Avenida Barão de Indaiá, nº 1025, Condomínio Residencial Laranjeiras, casa – 60, Alameda Graviolas, CEP – 69058-448 – Flores; JOSÉ MARIO FROTA MOREIRA, brasieliro, cearense, divorciado, advogado, inscrito na OAB/AM sob o número 640, Vereador do Município de Manaus, residente na Rua E-77, Quadra T ME: 7 conjunto Adrianópolis, CEP 69060-000, e domiciliado nesta cidade; ADEMAR VIEIRA DA SILVA, brasileiro, amazonense, solteiro, comerciante, vereador do Município de Manaus, portador da cédula de identidade sob o número 0809888, Cadastro de Pessoa Física número 313.862.882-68, residente e domiciliado nesta cidade, Vêm, mui respeitosamente à presença de Vossa Excelência, por intermédio de seu advogado, GUILHERME TORRES FERREIRA, OAB/AM sob o número 5692, com escritório profissional na Rua Rio Içá, número 39, Quadra 35, Vieiralves, impetrar com fundamento na Lei 12.016 de 7 de agosto de 2009:



MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE LIMINAR



Contra ato do EXCELENTÍSSIMO SENHOR VEREADOR LUIZ ALBERTO CARIJÓ, PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL, autoridade coatora, vinculada ao Município de Manaus, pelos fatos e fundamentos jurídicos adiante aduzidos:



DA COMPETÊNCIA.
Dispõe o artigo 72, inciso I, alínea “c” da Constituição do Estado do Amazonas, que:
“Artigo. 72. Compete, ainda, ao Tribunal de Justiça:

I - processar e julgar, originariamente:

c) O habeas data e o mandado de segurança contra os atos do Governador do Estado, do Vice - Governador, dos Prefeitos Municipais, do Presidente e Membros da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa do Estado, do Presidente da Câmara Municipal e de sua Mesa Diretora, do Presidente e dos Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado, do Procurador-Geral da Justiça, do Corregedor -Geral do Ministério Público, do Procurador-Geral do Estado, do Chefe da Defensoria Públ ica, de Secretários de Estado e do próprio Tribunal, do seu Presidente, do seu Vice -Presidente e do Corregedor -Geral de Justiça;”

DA LEGITIMIDADE ATIVA DOS VEREADORES E DIREITO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL
Primeiramente Excelência, deve-se assentar a possibilidade de controle jurisdicional do processo legislativo, visando a verificação de obediência ao Regimento Interno da Casa Legislativa.
Não sem razão o saudoso professor Hely Lopes Meirelles, em sua obra: Direito Municipal Brasileiro, Malheiros Editores, 6ª edição, 1993, página 448, afirma que:
“Quanto à atividade da Câmara o Vereador não só tem o direito de participar dela, na forma regimento, como tem qualidade para impedir, até mesmo por via judicial, qualquer desrespeito ao Regimento, que é a lei da Casa. Os atos praticados ao arrepio das normas regimentais são nulos, e essa nulidade pode ser reconhecida e declarada pelo Poder Judiciário, a pedido de qualquer Vereador em exercício, desde que comprove a ilegalidade.”
Continua o saudoso professor: “A participação efetiva nos trabalhos da Câmara tem para o Vereador o caráter dúplice de direito-dever. É direito individual resultante de sua investidura no mandato; É dever público para com a coletividade que o elegeu como seu representante e que, por isso mesmo o quer atuante em defesa dos interesses coletivos.”
Ademais, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no mesmo sentido (MS 23.565/DF. Rel. Min. Celso de Mello), senão vejamos:
“Importante, porém, analisar-se de a possibilidade do controle jurisdicional incidir sobre o processo legislativo em trâmite, uma vez que não existiria a lei ou ato normativo passível de controle concentrado de constitucionalidade. Assim sendo, o controle sobre propostas de emendas constitucionais sempre se dará de forma difusa, por meio de ajuizamento de mandado de segurança, por parte de parlamentares que se sentirem prejudicados durante o processo legislativo. Reitere-se que os únicos legitimados à propositura de mandado de segurança, para a defesa do direito líquido e certo de somente participaram de um processo legislativo conforme as normas constitucionais e legais, são os próprios parlamentares.”
Excelência, decerto não se tem proposta de emenda à constituição, de qualquer forma, está patente a legitimidade dos impetrantes em ajuizar a presente Ação Constitucional.
Ademais, trata-se de ato vinculado, ou seja, todos os elementos do ato: Competência, Objeto, Motivo, Forma e Finalidade, estão vinculados à lei, logo, havendo desrespeito à qualquer um deles, caberá controle judicial.
No caso em questão, os Impetrantes possuem não só o direito ao devido processo legal legislativo, mas, também, ao devido processo legal administrativo. Trata-se de ato administrativo ilegal que deve ser controlado e, por conseqüência, anulado.
Superada esta questão, passaremos à análise do Mérito.
DO MÉRITO
Os impetrantes são Vereadores do Município de Manaus e, nesta qualidade, possuem direito ao devido processo legal legislativo. Pois bem. Ocorre que os impetrantes, no dia 10 de fevereiro do corrente ano, requereram à mesa diretora da Câmara Municipal, em conformidade com a Lei Federal nº 1.579 cumulado com artigo 61, parágrafo 1º do Regimento Interno, bem como artigos 42 e 43 da Lei Orgânica do Município de Manaus, a criação da Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar e apurar a ineficiência na prestação do serviço de transporte público à população, bem como o sucateamento da frota de ônibus do Município de Manaus (basta verificar o requerimento em anexo).
Dispõe o artigo 58, parágrafo 3º da Constituição Federal que:
Art. 58. O Congresso Nacional e suas Casas terão comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação.
§ 3º - As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.

Do que se depreende do parágrafo alhures três são os requisitos para criação da comissão, senão vejamos:
A) Um terço de seus membros;
B) Fato determinado;
C) Prazo certo;
Ora, o Nobre Presidente da Câmara (Autoridade coatora), em “poucas palavras” arquivou pedido de abertura que continha assinatura de um terço dos Vereadores do Município. E mais: Pasme Excelência, mas a Autoridade coatora em questão, sequer motivou sua decisão, em total desrespeito às regras constitucionais.
Dispõe o artigo 93, inciso IX:
Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:
IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;

É bom que se diga que em uma democracia a maioria sempre vence (e essa é uma verdade que não se pode olvidar), no entanto, deve haver respeito pelas minorias. Em razão disso, construíram-se diversos instrumentos modernos de proteção das minorias (tais como as Ações Afirmativas) e de todos os grupamentos, como é o caso das novas Audiências Públicas desenvolvidas no âmbito do Poder Executivo, e as Comissões Parlamentares de Inquérito.
O requisito constitucional atrela-se ao requerimento, não podendo o mesmo ser revisto em plenário. Em razão disso, na ADI 055.218.0/2, o Tribunal de Justiça de São Paulo declarou a inconstitucionalidade da expressão "aprovados por maioria absoluta", constante do art. 33. da Lei Orgânica do Município de São Paulo: “As Comissões Parlamentares de Inquérito (...) serão criadas pela Câmara, mediante requerimento de 1/3 (um terço) de seus membros, aprovados por maioria absoluta (...)”.

Culto Julgador, no caso em questão, a minoria reuniu 14 (quatorze assinaturas), e indicou fato determinado. Decerto a ineficiência na prestação de serviço de transporte público não é um fato determinado, pois várias podem ser a causa de ineficiência. Contudo, o “sucateamento da frota de ônibus” certamente é um fato determinado, ao contrário do que afirmou a Autoridade Coatora em seu despacho de arquivamento.
Portanto, trata-se de motivo “falso” que deve ser anulado. A já consagrada Teoria dos Motivos Determinantes se insurge justamente contra isso, ou seja, evita que o Administrador, de forma arbitrária, determine a condução da administração pública de acordo com seu próprio entendimento desvirtuado da realidade. Em apertada síntese, pela teoria dos motivos determinantes, a validade do ato administrativo está vinculada a existência e veracidade dos motivos apontados como fundamentos para a sua adoção.

Ademais é válido dizer que o pluralismo político é valor básico que fundamenta a democracia moderna. Certamente está superada a concepção política de que a maioria é o único parâmetro de condução do poder. Deve haver respeito e compatibilização, ao máximo, dos interesses de todos os grupos que compõe o corpo social, inclusive dos núcleos minoritários. Em verdade, os anseios da minoria cederão parcialmente (excepcionalmente de forma total) apenas quando os seus interesses são colidentes com os da maioria.

Nada obstante este relevante precedente, a Suprema Corte ao julgar o MS 26441 contra ato da Mesa e do presidente da Câmara dos Deputados que – após a aprovação e a criação do inquérito parlamentar para investigar as causas, conseqüências e responsáveis pela crise ocorrida no setor aéreo brasileiro, a CPI do “apagão aéreo” – deferiu recurso contra a sua instalação. A base jurídica apresentada para tal deferimento foi o fato de que foi solicitada votação em plenário pela instalação e, neste escrutínio, não se atingiu o mínimo de 1/3 (um terço) dos parlamentares (a pressão da maioria certamente deve ter constrangido a minoria que a tinha solicitado). A minoria não conseguiu ratificar em plenário as 211 assinaturas do requerimento de criação da CPI, uma vez que somente 141 parlamentares manifestaram-se favoráveis a mesma, quando, para a Mesa, no mínimo seriam necessários 170 votos (1/3 da Casa).
O Ministro-relator, Celso de Mello, com o brilhantismo que lhe é peculiar, acertadamente, apontou que o requisito constitucional refere-se ao requerimento da instalação e NÃO A ATOS POSTERIORES. "A exigência é na gênese do requerimento", disse o eminente Ministro. “Pode ou não a maioria, sustentando-se no parágrafo 3º, do artigo 58 da Constituição, levantar questão de ordem e, por recurso, obstar a criação da CPI?” Não, respondeu o próprio Ministro, pois “a prerrogativa de investigar da minoria, já deferida, não poderia ser comprometida pelo bloco majoritário. Não se pode deslocar para o Plenário a decisão final da instalação da CPI, já que é poder constitucional das minorias o de fiscalizar, investigar e responsabilizar, a quem quer que seja, por atos administrativos.”

Citando parecer do Nobre Procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, o Ministro lembrou que “são apenas três os requisitos constitucionais exigidos para a criação de comissões parlamentares de inquérito: requerimento de um terço dos membros de uma ou das duas Casas Legislativas, apuração de fato determinado e fixação de prazo certo”. Assim, diz o procurador, "tenta-se impedir que investigações parlamentares fiquem sujeitas aos caprichos da maioria, geralmente desinteressada em apurar certos fatos que possam colocar em risco a reputação e os interesses que representa”.

O Ministro-relator citou, também, obra de consultor legislativo do Senado, Marcos Santi, que afirma: “No ato de criação de CPI, com a leitura e a publicação do requerimento, ou mesmo após a consumação dessas fases, as correntes parlamentares que a ela se opõem muitas vezes tentam inviabilizar o inquérito parlamentar. Por isso, quando da consumação da criação de uma CPI, ou mesmo quando essa já tiver sido criada, a base parlamentar de apoio ao Presidente da República com freqüência tem lançado mão de um último instrumento parlamentar: ANULAR O REQUERIMENTO, POR MEIO DO QUESTIONAMENTO CONSTITUCIONAL – E TAMBÉM REGIMENTAL – DO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DE CRIAÇÃO DA COMISSÃO. Nessa medida, a análise da constitucionalidade do requerimento passa a ocupar o centro do debate político-parlamentar e caracterizar-se como um obstáculo adicional a ser superado para se viabilizar o inquérito parlamentar. Esse confronto expõe o que denominamos ‘tensão entre o direito das minorias’ – que em tese deveria estar assegurado com o preenchimento dos requisitos de criação da CPI – ‘e os interesses da maioria’, uma vez que esta, sentindo-se ameaçada, atua no sentido de tentar impedir o inquérito” (grifo nosso).

DO CONTROLE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS PELO PODER JUDICIÁRIO
Nobre julgador, ad argumentando tantum, insisto: os atos administrativos podem ser vinculados ou discricionários. Em se tratando de ato administrativo vinculado, todos os elementos (competência, motivo, objeto, forma e finalidade) estão vinculados à lei. Por outro lado, em se tratando de ato administrativo discricionário, na verdade, apenas motivo e objeto são discricionários, portanto, o administrador não tem total liberdade, o que ocorre é uma discricionariedade regrada, mitigada, porquanto competência, forma e finalidade são vinculadas. Portanto, discute-se, na doutrina, se o judiciário pode controlar os atos administrativos vinculados e discricionários.
Com relação ao ato administrativo vinculado, decerto não há dúvida, há efetivo controle em todos os seus elementos. Por outro lado, com relação ao ato administrativo discricionário, primeiro deve-se controlar para saber se realmente o é, segundo deve se verificar se o ato administrativo violou proporcionalidade e razoabilidade, portanto, NÃO SE TRATA DE CONTROLE DE MÉRITO (é bom que se diga), mas sim, controle de legalidade em sentido amplo.
Superada esta questão, percebe-se que tanto o ato vinculado quanto o ato discricionário são passíveis de controle pelo Judiciário. Justifico melhor:
O controle externo pelo Judiciário foi aumentado e fortalecido na Constituição de 1988. Agora não se limita ao exame das lesões de direito. A mera ameaça já fundamenta a revisão ou correção judicial. Ao se referir a direito, incluiu os coletivos e os difusos.

Os remédios de correção também se ampliaram. Aparece o mandado de segurança com perfil mais bem delineado, acolhendo o texto as afirmações doutrinárias acerca do tema. Surge o mandado de segurança coletivo, a possibilitar o enfrentamento de situações que atinjam classes ou a sociedade (direitos difusos). A ação civil pública passar a existir com características de direito e garantia constitucional. A ação de responsabilidade extracontratual torna-se mais abrangente, colhendo em suas malhas os delegados de serviço público, os prestadores de serviço público, amparando as construções doutrinarias.

O controle judiciário ou judicial é o exercido privativamente pelos órgãos do Poder Judiciário sobre os atos administrativos do executivo, do Legislativo e do próprio Judiciário quando realiza atividade administrativa. É, sobretudo, um meio de preservação de direitos individuais, pois visa impor a observância da lei em cada caso concreto, quando reclamada por seus beneficiários. Estão sujeitos a esse controle os atos administrativos em geral.

A legalidade do ato administrativo é condição primeira para sua validade e eficácia. Nos Estados de Direito, como o nosso, não há lugar para o arbítrio, a prepotência, o abuso de poder. O particular lesado em seus direitos por ato ilegal da Administração poderá utilizar-se das vias judiciais comuns para obter não só a anulação do ato como a reparação dos danos causados pela conduta ilegal do Poder Público. A jurisprudência brasileira, acompanhada pela doutrina tradicional, considerava que os atos discricionários não se submeteriam a controle no atinente a seu mérito, porém o conteúdo de ‘mérito’ era, por demais, alargado. Ademais, negava a jurisprudência, também alicerçada na doutrina, a necessidade de motivação dos atos discricionários.

O caminho da evolução foi a afirmação de que ao Judiciário caberia controlar toda a atividade administrativa, desde que não invadisse o mérito das decisões discricionárias. Por mérito entendiam-se as razões de conveniência e oportunidade que teriam fundamentado a decisão do administrador. Quaisquer que sejam a procedência, a natureza e o objeto do ato, desde que traga em si a possibilidade de lesão a direito individual ou ao patrimônio público, ficará sujeita a apreciação judicial.

O ato vinculado é analisado apenas quanto ao aspecto da legalidade do ato. O ato discricionário deve ser analisado pelo Judiciário, em primeiro lugar, conforme já foi dito alhures, para verificar se realmente o é. Depois apura se a discrição não desbordou para o arbítrio ou para a irrazoabilidade.

O Judiciário não pode ir além do exame da legalidade para emitir um juízo de mérito sobre os atos da Administração. O conceito de ilegalidade abrange a violação frontal da lei, o abuso por excesso ou desvio de poder, ou por relegação dos princípios gerais do direito ou pela decisão irrazoável. Não se aprecia a conveniência, a oportunidade ou a justiça do ato impugnado, mas unicamente sua conformação, forma e ideológica com a lei em sentido amplo.

Excelência é importante destacar que não há de se confundir o mérito administrativo do ato, imune à revisão judicial (ponto pacífico na jurisprudência), com o exame de seus motivos determinantes, sempre passíveis de verificação em juízo. O ato administrativo, individual ou de caráter normativo deve ser esmiuçado até o limite em que o próprio magistrado entenda ser seu campo de atuação.
Portanto, não há atos que se preservem ao primeiro exame judicial. O limite de atuação do Poder Judiciário será gizado pelo próprio Judiciário, que tem por finalidade dizer o direito no caso concreto, sem invadir a competência administrativa. Isso faz parte do equilíbrio e do jogo dos poderes.
No caso sub examen resta ostensiva a ilegalidade e o abuso de poder que foram perpetrados pela autoridade coatora ao arquivar requerimento de abertura de CPI.
FUNDAMENTOS JURÍDICOS
Trata-se de mandamus impetrado contra ato eivado de ilegalidade e de abuso de poder, praticado pelo Sr. Presidente da Câmara Municipal de Manaus que arquivou requerimento de abertura de sindicância.
O art. 1º da Lei 12.016 de 7 de agosto de 2009. reza o seguinte:
Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.
§ 1o Equiparam-se às autoridades, para os efeitos desta Lei, os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições.
No mesmo sentido, reza o art. 5º, inc. LXIX, da Constituição Federal que:
"Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público".
ILEGALIDADE E ABUSO DE PODER EM RELAÇÃO AO ATO PERPETRADO PELA AUTORIDADE COATORA
Para concessão do mandamus exige-se a prática de ato ilegal ou abusivo por parte da autoridade. Esclarece a doutrina que o ato de autoridade, mencionado pelo Legislador, deve ser entendido em sentido amplo, abarcando, inclusive, eventual omissão da autoridade. Sobre o exposto, pode-se colacionar o seguinte excerto:
Ato de autoridade é toda manifestação ou omissão do Poder Público ou de seus delegados, no desempenho de suas funções ou a pretexto de exercê-las. Por autoridade entende-se a pessoa física investida de poder de decisão dentro da esfera de competência que lhe é atribuída pela norma legal (MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança. 26. ed. atual e ampl. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 33.)
Intruje-se, assim, do escólio citado que a ilegalidade de um ato é entendida também em sentido amplo. Por outras palavras: a ilegalidade não resulta apenas da violação da lei ordinária, da lei em sentido estrito, mas também da própria Constituição Federal. O abuso de poder ocorre quando o agente público incorre em excesso na prática do ato.
VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE OU DA PROPORCIONALIDADE
Reza o art. 2º da Lei 9784/99 o seguinte:
"A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade (grifo nosso), moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência".
Trata-se de dispositivo contido em lei que dispõe sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal. De qualquer sorte, os princípios que aí estão previstos devem nortear a atuação de qualquer Administrador Público, sendo, portanto, aplicáveis nas esferas Estadual e Municipal. Dentre os diversos princípios previstos, destaca-se o da proporcionalidade ou da razoabilidade.
Ressalte-se, outrossim, que o princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade encontra assento no Texto Constitucional, a despeito de ser implícito. De fato, o citado postulado não está expresso na Constituição, mas deriva do art. 5º, § 2º do texto magno ou mesmo da própria estrutura do Estado de Direito. Nesse sentido, pode-se colacionar o seguinte escólio:
"O princípio da proporcionalidade é, por conseguinte, direito positivo em nosso ordenamento constitucional. Embora não haja sido ainda formulado como ´norma jurídica global´, flui do espírito que anima em toda sua extensão e profundidade o § 2º do art. 5º, o qual abrange a parte não-escrita ou não expressa dos direitos e garantias da Constituição, a saber, aqueles direitos e garantias cujo fundamento decorre da natureza do regime, da essência impostergável do Estado de Direito e dos princípios que este consagra e que fazem inviolável a unidade da Constituição" (BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 396.)
Adotar-se-á, aqui, para efeito de facilitação da argumentação, a tese de que razoabilidade e proporcionalidade têm a mesma significação. Nesse sentido, inclusive, orienta-se o Ministro do STF, Prof. Gilmar Ferreira Mendes. Cf. MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de direito constitucional. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1999. p. 42-44.
O princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade proíbe a atuação com excesso, a atuação desigual e irrazoável. Por outras palavras: a razoabilidade ou proporcionalidade consiste em uma medida de justiça. A Administração Publica, na prática dos seus atos administrativos, deve sempre portar-se de forma razoável. Nesse sentido, pode-se citar o seguinte:
"O princípio da razoabilidade postula da Administração Pública uma atuação consentânea com a realidade com a qual está lidando e valorando. Aqui o que se veda são ações desarrazoadas ou despropositadas diante da gama de situações posta sob a consideração do administrador (grifo nosso) (COELHO, Paulo Magalhães da Costa. Manual de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 46).


DIREITO LÍQUIDO E CERTO DA IMPETRANTE
Cumpre, agora, analisar o direito líquido e certo da impetrante. Primeiramente, é oportuno consignar no que consiste o direito líquido e certo. Sobre isso, colaciono os seguintes excertos:
"Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante" (...) (MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança. 26. ed. atual e ampl. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 36).
Direito líquido e certo há quando a ilegalidade ou a Abusividade forem passíveis de demonstração documental, independentemente de sua complexidade ou densidade (grifo nosso) (BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 13).
O direito líquido e certo, portanto, é aquele demonstrado de plano e por meio de prova documental. In casu, tem-se prova documental de todo o alegado (docs. 1-8) e a ilegalidade e o abuso de poder do ato praticado pela Autoridade coatora são ostensivos.
PRESENÇA DOS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DA LIMINAR: FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA
A liminar em mandado de segurança é um mecanismo de tutela do dano marginal ou mediato. Mais do que isso, pode-se mesmo dizer que a liminar é inerente, isto é, é ínsita ao mandado de segurança.
Nesse sentido, pode-se citar o seguinte:
"A liminar é, assim, a peça essencial ao funcionamento do mandado de segurança. (...) Como bem remarcou o Prof. Arruda Alvim ´em quase cem por cento dos casos, quem impetra uma segurança quer uma medida liminar´. Tal assertiva dá a idéia exata da importância capital da medida liminar no âmbito do mandado de segurança (grifo nosso)" (ORIONE NETO, Luiz. Liminares no processo civil. 2. ed. São Paulo: Método, 2002. p. 310 e 311).
Os requisitos para concessão da medida liminar são fumus boni iuris e periculum in mora. O primeiro relaciona-se à plausibilidade do direito, ou seja, à fumaça do bom direito. Já o segundo está relacionado com o eventual perigo na demora na concessão de medida judicial.
O fumus boni iuris, no caso sub examen, resulta de toda a argumentação deduzida nesta peça, assim como de todos os documentos que foram coligidos aos autos. A ilegalidade do ato perpetrado pela Autoridade coatora - de arquivar requerimento de abertura de CPI -, pelos diversos argumentos aqui aduzidos, caracteriza a plausibilidade do direito.
O periculum in mora reside no fato de que a população de Manaus, vem sofrendo constantemente com crise no transporte municipal e, até que as investigações se encerrem, corre o perigo de a maioria tentar esmagar a minoria, constrangendo-os à retirada da assinatura do requerimento.
Importante ressaltar, ainda, que a concessão da liminar não é uma faculdade do Magistrado. De fato, presentes os seus pressupostos deverá ser necessariamente deferida. Nesse sentido:
"A liminar não é uma liberdade da Justiça: é medida acauteladora do direito do impetrante, que não pode ser negada quando ocorrerem os seus pressupostos (grifo nosso) como, também, não deve ser concedida quando ausentes os requisitos de sua admissibilidade" (MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança. 26. ed. atual e ampl. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 77).
Consigne-se, outrossim, que não há ocorrência do periculum in mora inverso, isto é, nenhum prejuízo advirá para a Autoridade coatora com a concessão da liminar.
DO PEDIDO
Ante o exposto, requer a V. Exa.:
1) Seja concedida a liminar inaudita altera parte para o fim de ser determinado à autoridade coatora, Sr. PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE MANAUS, receba o requerimento de abertura da CPI, sob pena de a autoridade coatora, não o fazendo, incorrer em desobediência e nas sanções previstas no art. 14, parágrafo único do CPC;
2) Oficie-se à autoridade coatora para o fim de prestar as informações no prazo de 10 dias;
3) Intime-se o Representante do Ministério Público para fins de intervenção no feito, como custos iuris, na forma do art. 12º da Lei n. 12.016 de 7 de agosto de 2009;
4) No mérito, seja confirmada a liminar em todos os seus termos, julgando-se integralmente procedente o pedido, concedendo-se, em definitivo, a segurança liminarmente pleiteada;
7) que seja concedido o benefício da Justiça Gratuita nos termos do art. 4º da Lei 1060/50.
Dá-se à causa o valor de R$ 100,00 (cem reais)


Nestes termos,
pedem deferimento.



Manaus, 19 de fevereiro de 2010.



GUILHERME TORRES FERREIRA


OAB/AM 5692